Em 2020, 25 306 mulheres portuguesas foram diagnosticadas com cancro, sendo que 28% deles eram da mama, segundo o relatório “Perfil de saúde do país 2021”, lançado pela OCDE, em parceria com a European Observatory on Health Systems and Policies e a Comissão Europeia. Na prática, traduz-se em mais de sete mil casos, que resultaram em 1800 mortes. Apesar de muito mais frequente na população feminina, a Liga Portuguesa Contra o Cancro dá conta de um em cada 100 homens são apanhados pela doença.
A nível mundial, estimam-se 2,3 milhões de casos anuais e 685 mil mortes. Este cenário é ditado, em parte, pela incapacidade de os doentes responderem positivamente ao tratamento, muitas das vezes porque há variações a nível genético e molecular que o tornam ineficaz.
Atualmente, as linhas de investigação procuram soluções individualizadas, indicadas para cada paciente e respetivo tumor, e até já se recorre a tecnologia genómica combinada com a digitalização, que permite avaliar o ADN, RNA, proteínas e metabolitos. No entanto, estas técnicas só chegam a casos altamente específicos, não podendo ser aplicadas transversalmente.
A ciência continua a debater-se para solucionar este obstáculo, de forma a garantir que o tratamento é adequado e que traz resultados positivos, salvando inúmeras vidas e prolongando outras tantas. E é para este servir este propósito que a supercomputação tem vindo a ser particularmente útil, na medida em que está a ajudar a desenvolver uma plataforma fácil de usar, intitulada JADBio autoML, com o propósito de esta identificar os fármacos mais suscetíveis de serem eficazes para cada paciente antes de iniciarem o tratamento, recorrendo, para tal, ao perfil molecular de cada um dos doentes.
O que é que está a ser feito? E como?
A empresa inglesa CHOSA – que se dedica a desenvolver técnicas para prever os resultados de tratamentos anticancerígenos -, em parceria com profissionais de farmacologia molecular e na identificação de biomarcadores do cancro da Universidade Helénica Mediterrânica (Grécia), e também com a empresa grega JADBIO – responsável pelo desenvolvimento da plataforma, com recurso a machine learning (ML) – começou por analisar uma extensa base de dados que liga 60 linhas de células cancerosas humanas (associadas a diferentes tipos de cancro) à atividade anticancerígena de mais de 50 mil compostos (medicamentos). Já aqui, a computação de alto desempenho mostrou-se essencial para o pouco tempo em que foi possível fazê-lo
Dos cerca de 50 mil compostos (que incluem medicamentos já estabelecidos ou misturas deles recentemente desenvolvidas), utilizando critérios de qualidade específicos, foram selecionados 5 986 para prosseguirem para outras análises. A plataforma JADBio autoML (de Machine Learning) e outros recursos HPC mostraram-se particularmente relevantes a partir desta fase, uma vez que possibilitaram a construção de modelos de aprendizagem automática dos quase 6 mil compostos selecionados, de forma a conseguir estimar o desempenho de cada um deles em tratamentos anticancerígenos.
As contas finais dão conta de que 119 dos modelos construídos têm um poder preditivo significativo e 8 deles parecem ser particularmente relevantes para o cancro da mama.
Posteriormente às restantes fases de validação, vai ficar disponível uma espécie de base de dados, a Allied Intelligence for Drug Accuracr (AÏDA) que prevê a eficácia de diferentes medicamentos contra o cancro de cada paciente. Desta forma, os médicos poderão aceder a um documento com um vasto número de fármacos, no qual surgem destacados os que maior probabilidade têm de funcionar para um determinado cancro de um paciente.